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Cancelamento Imotivado de Plano Coletivo com Menos de 30 Vidas: O Dever de Justificar e a Proteção à Saúde

A estabilidade contratual em planos de saúde é elemento essencial à dignidade dos beneficiários, especialmente em contextos de vulnerabilidade clínica. A recente decisão do Tribunal de Justiça do Ceará (TJ/CE), obrigando a Unimed a restabelecer um plano coletivo com menos de 30 beneficiários rescindido sem justificativa idônea, reforça a função social dos contratos e a necessidade de fundamentação em casos de cancelamento unilateral.

O Caso e a Decisão Judicial

Uma empresa de tecnologia da informação, contratante de plano coletivo com 11 vidas, foi surpreendida com a rescisão unilateral do contrato pela operadora Unimed. A justificativa apresentada limitou-se à “regularidade contratual da rescisão”, sem motivação clara. Entre os beneficiários estava uma criança em tratamento para Transtorno do Espectro Autista (TEA), cuja continuidade terapêutica depende da manutenção do plano.

Diante do risco iminente de interrupção do tratamento, a empresa buscou o Poder Judiciário e obteve liminar. A 1ª Câmara de Direito Privado do TJ/CE, por unanimidade, confirmou a decisão, ordenando o restabelecimento do plano. O relator, desembargador José Ricardo Vidal Patrocínio, reconheceu a ausência de motivação válida e destacou o risco grave à saúde da criança.

A Obrigatoriedade de Justificativa em Planos Pequenos

Embora o Tema Repetitivo 1.047 do STJ, que trata da validade da rescisão unilateral em contratos coletivos com menos de 30 beneficiários, ainda esteja pendente de julgamento, a jurisprudência majoritária tem se consolidado no sentido de que a rescisão nesses casos deve ser motivada. A ausência de motivação fere princípios como:

  • Boa-fé objetiva: que exige lealdade e transparência contratual;
  • Função social do contrato: que impõe equilíbrio e respeito aos fins sociais do ajuste;
  • Proteção da parte vulnerável: especialmente em contratos de adesão com cláusulas uniformes.

A relação contratual entre operadora e beneficiários, ainda que formalmente empresarial, revela traços de hipossuficiência dos contratantes, que muitas vezes dependem do vínculo para tratamentos contínuos e essenciais.

Continuidade Assistencial: Aplicação do Tema 1.082 do STJ

Além da questão contratual, o TJ/CE aplicou por analogia o Tema 1.082 do STJ, que estabelece que mesmo após a rescisão de plano coletivo, a operadora deve garantir o tratamento em curso até a alta médica, desde que os encargos financeiros sejam regularmente pagos. A lógica da proteção à vida e à saúde se sobrepõe a cláusulas unilaterais que comprometam a continuidade do cuidado.

Responsabilidade da Operadora e Direito à Saúde

A operadora de plano de saúde, enquanto fornecedora de serviço essencial, está submetida ao Código de Defesa do Consumidor (CDC) e à Lei nº 9.656/1998. O cancelamento imotivado de contrato coletivo, sem justa causa e sem ponderar o impacto assistencial, constitui prática abusiva, sujeita à reparação por danos e eventual responsabilização judicial.

A decisão do TJ/CE reafirma que o simples número de beneficiários não pode justificar condutas que atentem contra direitos fundamentais, especialmente quando há pacientes em tratamento ativo.

Conclusão

A tentativa de cancelamento imotivado de planos coletivos com menos de 30 vidas é prática que contraria a jurisprudência consolidada e princípios constitucionais. A decisão do TJ/CE cumpre relevante papel ao reafirmar a proteção da parte vulnerável, a necessidade de motivação e o compromisso com a saúde e dignidade humana.

Beneficiários e empresas atingidos por esse tipo de conduta devem buscar assessoria jurídica especializada. A judicialização, nesses casos, é legítima e necessária para garantir a integridade do cuidado médico e o respeito ao contrato.

Processo: 0000000-00.2024.8.06.0000

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