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Cancelamento de Plano Falso Coletivo com Pacientes em Tratamento: A Proteção Contra Abusos na Saúde Suplementar

1. Introdução

O cancelamento unilateral de planos de saúde coletivos por iniciativa da operadora tem sido objeto de crescente judicialização, especialmente nos chamados “falsos coletivos”. A recente decisão da 34ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo/SP reforça o entendimento de que planos coletivos familiares, que não possuem vínculo real com pessoa jurídica contratante, devem ser protegidos como contratos individuais, sobretudo quando há tratamentos médicos em curso. A sentença garante a continuidade da cobertura assistencial e reconhece a abusividade de cláusulas que autorizam a rescisão imotivada em contextos de vulnerabilidade.

2. O Caso Concreto

Uma beneficiária ajuizou ação após receber notificação de rescisão contratual, com aviso prévio de encerramento do plano de saúde que incluía seus filhos. O plano, classificado formalmente como coletivo empresarial, contava com apenas quatro beneficiários do mesmo núcleo familiar. A autora alegou que a cláusula de rescisão unilateral era abusiva e que a interrupção do contrato comprometeria o tratamento médico e psicológico em andamento.

A operadora, por sua vez, defendeu a legalidade do cancelamento, alegando previsão contratual e possibilidade de portabilidade para outro plano.

3. A Natureza Jurídica dos “Falsos Coletivos”

Na sentença, o juiz Pedro Henrique Valdevite Agostinho aplicou entendimento consolidado do Tribunal de Justiça de São Paulo, reconhecendo que planos coletivos com poucos beneficiários do mesmo grupo familiar não se submetem à lógica dos contratos empresariais genuínos. Tais contratos são considerados “falsos coletivos” e, portanto, devem ser tratados como individuais, atraindo as restrições do artigo 13, parágrafo único, inciso II da Lei nº 9.656/98, que proíbe o cancelamento imotivado.

4. A Proteção ao Tratamento Continuado

Outro ponto essencial da decisão foi a proteção aos beneficiários em tratamento médico. Ainda que o plano fosse genuinamente coletivo, o magistrado destacou a aplicação do Tema 1.082 do STJ, segundo o qual é vedado à operadora rescindir o contrato durante o curso de tratamento de doenças graves, especialmente quando há risco à saúde ou à vida do consumidor.

A jurisprudência reforça a tese de que a saúde e a dignidade da pessoa humana se sobrepõem à lógica contratual comercial, cabendo ao Judiciário intervir para evitar rupturas injustificadas em atendimentos essenciais.

5. Cláusula Abusiva e Código de Defesa do Consumidor

O magistrado declarou a cláusula de rescisão unilateral imotivada como abusiva, com fundamento no artigo 51, inciso IV do Código de Defesa do Consumidor, que considera nulas cláusulas que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada ou que contrariem a boa-fé objetiva e a função social do contrato.

A decisão também reafirma a inaplicabilidade de cláusulas genéricas de rescisão em contextos de vulnerabilidade, como quando há pacientes em acompanhamento psicológico e tratamento clínico.

6. Conclusão

A decisão da 34ª Vara Cível de São Paulo representa importante avanço na proteção dos consumidores de planos de saúde, especialmente em contratos que, embora formalmente coletivos, configuram verdadeiros vínculos familiares ou individuais. Ao reconhecer a abusividade da cláusula de rescisão unilateral e garantir a continuidade do atendimento, o Judiciário reafirma a supremacia do direito à saúde sobre interesses econômicos das operadoras.

Beneficiários que enfrentarem situações similares devem buscar orientação jurídica especializada e, quando necessário, acionar o Poder Judiciário para preservar seu direito à assistência médica contínua. Afinal, saúde não é mercadoria — é um direito fundamental.

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