1. Introdução
A recente decisão da 1ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal reforça um ponto essencial no Direito da Saúde: o rol da ANS não pode servir de escudo para negar tratamentos indispensáveis. O tribunal determinou que um plano de saúde fornecesse o medicamento Ivosidenibe, indicado para tratar um câncer hepático raro, mesmo não estando listado no rol da ANS.
Esse entendimento reflete a linha já consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) de que, diante da prescrição médica e da comprovação científica de eficácia, o tratamento deve ser custeado pelo plano de saúde, priorizando a preservação da vida e da saúde do paciente.
2. O Caso Concreto
No processo em questão (0716292-50.2024.8.07.0020), uma paciente diagnosticada com câncer hepático raro buscou, na Justiça, o fornecimento do medicamento Ivosidenibe.
O plano de saúde havia negado a cobertura sob o argumento de que se tratava de fármaco de alto custo e não listado no rol da ANS.
O desembargador Teófilo Caetano, relator do caso, afastou essa justificativa e destacou que a recusa desconsiderava tanto a gravidade da doença quanto a prescrição médica. A Turma decidiu, de forma unânime, pela obrigatoriedade de fornecimento do medicamento e ainda condenou a operadora ao pagamento de indenização por danos morais de R$ 10 mil.
3. Fundamentação Jurídica
A decisão baseia-se na Lei nº 9.656/1998 e na Lei nº 14.454/2022, que definem que o rol da ANS é apenas uma referência básica, e não uma lista taxativa.
O STJ já consolidou, no Tema 1.082, que planos de saúde devem custear procedimentos ou medicamentos fora do rol sempre que:
- houver prescrição médica fundamentada;
- existir comprovação científica da eficácia do tratamento;
- houver recomendação da Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS) ou de órgãos internacionais de referência.
Negar cobertura nesses casos configura prática abusiva, violando os princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato, além de afrontar os direitos fundamentais à vida e à saúde.
4. Impactos Práticos para Beneficiários e Operadoras
- Para beneficiários: a decisão reforça que pacientes não estão limitados ao rol da ANS quando o tratamento prescrito é comprovadamente eficaz e necessário. Isso amplia a segurança de quem enfrenta doenças graves, garantindo acesso às melhores terapias disponíveis.
- Para operadoras: a jurisprudência deixa claro que negativas baseadas exclusivamente no rol da ANS podem gerar não apenas a obrigação de custear o tratamento, mas também condenações em danos morais.
Esse cenário exige que as operadoras adotem maior cautela e transparência em suas negativas, evitando práticas abusivas que coloquem em risco a vida do beneficiário.
5. Conclusão
A decisão do TJDFT reafirma um princípio fundamental: a saúde do paciente deve prevalecer sobre cláusulas contratuais restritivas.
Quando um medicamento, ainda que fora do rol da ANS, é o mais eficaz para preservar a vida, a recusa de cobertura é abusiva e ilegal.
Para os beneficiários, a mensagem é clara: não aceitem negativas como resposta definitiva. E para os profissionais do Direito da Saúde, essa jurisprudência representa um importante instrumento para assegurar o acesso à saúde digna e integral.
Processo: 0716292-50.2024.8.07.0020 – TJDFT