1. Introdução
A evolução tecnológica na Medicina tem proporcionado alternativas cirúrgicas menos invasivas e mais seguras para os pacientes. Entre elas, destaca-se a cirurgia robótica, que oferece maior precisão, menor tempo de recuperação e redução de complicações pós-operatórias. No entanto, o custo elevado do procedimento e a resistência das operadoras de planos de saúde em custeá-lo têm gerado intensa judicialização.
Nesse contexto, o Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) reafirmou o entendimento de que a negativa de cobertura para cirurgia robótica é abusiva, ao condenar uma operadora a reembolsar integralmente o valor pago por um paciente com câncer de próstata que teve a cobertura indevidamente negada.
A decisão segue o entendimento consolidado de que, embora as operadoras possam limitar as doenças cobertas, não podem interferir no tratamento prescrito pelo médico assistente.
2. O Caso Concreto
O beneficiário, diagnosticado com câncer de próstata, teve indicação médica para cirurgia robótica, técnica minimamente invasiva reconhecida por sua eficácia e precisão no tratamento oncológico. No entanto, a operadora do plano de saúde negou a cobertura, sob o argumento de que o procedimento não constava no rol de procedimentos da ANS e não possuía código específico para reembolso.
Diante da negativa, o paciente custeou o tratamento particular e ingressou com ação judicial. O juízo de primeira instância condenou a operadora ao reembolso integral dos valores, entendimento mantido pela 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais de Goiás.
O relator, juiz André Reis Lacerda, reconheceu que o procedimento era essencial para o êxito do tratamento, destacando que o paciente comprovou documentalmente o gasto e que a negativa de cobertura afrontava a boa-fé contratual e a função social do contrato.
3. Fundamentação Jurídica
A decisão baseia-se em princípios fundamentais do Direito do Consumidor e da Saúde Suplementar:
- Art. 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor (CDC): considera nulas as cláusulas contratuais que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada ou que restrinjam direitos inerentes à natureza do contrato.
- Lei nº 9.656/98 (Lei dos Planos de Saúde): garante cobertura de todas as doenças listadas na Classificação Internacional de Doenças (CID), vedando a exclusão de tratamentos indispensáveis à cura.
Assim, ao negar o custeio de uma cirurgia robótica devidamente indicada, a operadora incorreu em prática abusiva, uma vez que a tecnologia tem comprovação técnico-científica e é amplamente reconhecida por órgãos médicos e pela literatura especializada.
4. Impactos Práticos da Decisão
A decisão do TJ-GO tem relevância não apenas para o paciente beneficiado, mas para todo o sistema de saúde suplementar:
- Para os pacientes, reafirma o direito de acesso a tratamentos modernos e eficazes, sem que critérios administrativos restrinjam a conduta médica.
- Para os médicos, fortalece a autonomia profissional, garantindo que a escolha terapêutica prevaleça sobre interesses financeiros das operadoras.
- Para as operadoras, sinaliza que a insistência em negar tratamentos com respaldo científico pode resultar em condenações judiciais e danos à imagem institucional.
O precedente ainda contribui para uniformizar o entendimento de que o avanço tecnológico na Medicina não pode ser pretexto para negar cobertura, desde que a eficácia e a segurança do tratamento estejam comprovadas.
5. Conclusão
A decisão do TJ-GO reforça a consolidação de uma jurisprudência protetiva ao consumidor e em consonância com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF).
O custeio da cirurgia robótica não é uma liberalidade, mas uma obrigação legal e contratual, quando há prescrição médica fundamentada e respaldo técnico-científico.
Negar esse tipo de cobertura é ignorar o avanço da Medicina e colocar em risco o direito fundamental à saúde. O caso demonstra que o papel do Judiciário é essencial para equilibrar a relação entre pacientes e operadoras, garantindo que a ciência prevaleça sobre a burocracia e que a vida esteja sempre acima do custo.
Processo: 5398314-61.2025.8.09.0051 – TJ/GO
