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Cláusula de Fidelidade em Planos de Saúde com Menos de 30 Vidas

A imposição de cláusulas de fidelidade, multa por rescisão antecipada e exigência de aviso prévio por operadoras de planos de saúde tem gerado intensa controvérsia, especialmente quando aplicada a contratos com poucas vidas, geralmente celebrados por micro e pequenas empresas. Em recente julgamento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) passou a analisar a legalidade dessas cláusulas em contratos empresariais com menos de 30 beneficiários — situação que, para muitos especialistas, configura o chamado “falso coletivo”.

O Caso: Cláusulas de Permanência Mínima e Multas Exorbitantes

A ação foi proposta pelo Ministério Público Federal contra a operadora Amil, que impunha aos contratantes do plano coletivo empresarial 118B a permanência mínima de 12 meses, multa de 50% sobre os valores restantes em caso de saída antecipada e aviso prévio de 60 dias para rescisão. O contrato era voltado a micro e pequenas empresas, com número reduzido de beneficiários.

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT) já havia declarado a nulidade das cláusulas, considerando abusiva a penalização sem contrapartida concreta ao consumidor. Agora, a 3ª Turma do STJ discute se essas exigências contratuais violam o Código de Defesa do Consumidor (CDC), especialmente quando aplicadas a grupos reduzidos de usuários que, embora enquadrados como empresariais, estão em situação de hipervulnerabilidade.

O Voto da Relatora: Defesa da Parte Mais Fraca

A ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, já proferiu voto reconhecendo que a imposição de fidelidade contratual e multa em planos com menos de 30 vidas é inválida, por caracterizar relação de consumo com evidente desequilíbrio contratual.

Segundo a ministra, contratos empresariais com poucos beneficiários não podem ser equiparados a grandes negociações corporativas. Ao contrário, envolvem pessoas físicas, pequenos empreendedores ou familiares que contratam planos de saúde por ausência de opções individuais no mercado — sendo, portanto, merecedores da proteção do CDC.

Nancy Andrighi ressaltou ainda que a Resolução Normativa 557/22 da ANS não autoriza, de forma expressa, a aplicação de cláusulas de fidelização prejudiciais ao consumidor. Por isso, manteve a decisão do TJDFT, afastando as exigências contratuais e reafirmando a necessidade de interpretação protetiva frente aos princípios da boa-fé e da função social do contrato.

A Natureza dos “Falsos Coletivos”

O ponto central da discussão está na configuração dos chamados “falsos coletivos” — contratos empresariais firmados por empresas de fachada, criadas unicamente para possibilitar o acesso ao plano de saúde, em substituição aos planos individuais. Essa prática é comum no mercado brasileiro, impulsionada pela escassez de planos individuais e pela maior liberdade que as operadoras têm para impor reajustes e cláusulas em planos coletivos.

Entretanto, a jurisprudência tem reconhecido que esses contratos devem ser analisados com base nas regras dos planos individuais, especialmente quando envolvem até 29 beneficiários, nos termos do artigo 2º da RN 195/2009 da ANS, e diante da evidente hipossuficiência do contratante.

A Prática Abusiva e a Responsabilidade das Operadoras

Cláusulas que restringem de forma desequilibrada o direito de rescindir o contrato sem prejuízos, sem oferecer uma contrapartida proporcional, são consideradas abusivas à luz do art. 51 do CDC. A imposição de multas elevadas e prazos excessivos para rescisão, especialmente em contratos de saúde, viola o direito à livre escolha e compromete o acesso à assistência médica mais adequada ao beneficiário.

A jurisprudência vem consolidando a ideia de que a fidelidade contratual só pode ser exigida se houver benefício real ao consumidor, como desconto expressivo ou vantagens adicionais. Do contrário, trata-se de cláusula nula por gerar vantagem excessiva à operadora e limitar de forma injusta os direitos do usuário.

Conclusão

O julgamento em curso no STJ representa um marco importante na proteção dos usuários de planos de saúde ditos “coletivos”, mas que, na prática, funcionam como planos individuais disfarçados. A tendência da Corte, conforme sinalizado pela relatora, é no sentido de reconhecer a invalidez de cláusulas de fidelidade e multa em contratos com menos de 30 vidas, reafirmando a supremacia do interesse do consumidor e o respeito à boa-fé contratual.

Consumidores que se veem presos a contratos com cláusulas abusivas de fidelização devem buscar orientação jurídica especializada. A Justiça tem reafirmado o direito à saúde como prioridade, mesmo frente a contratos aparentemente empresariais.

Processo: REsp 2.190.906

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