A atuação médica exige, além de preparo técnico, o cumprimento rigoroso de normas éticas e legais. Um dos aspectos mais delicados no cenário atual é a publicidade médica, especialmente quando envolve a divulgação de especialidades para as quais o profissional não possui o devido Registro de Qualificação de Especialista (RQE). Casos como o da médica presa em flagrante em Goiânia (GO), por se apresentar como nutróloga sem a especialização, evidenciam os riscos concretos dessa prática.
Por que o RQE é indispensável?
O RQE é o número que comprova, perante o Conselho Regional de Medicina (CRM), que o médico é especialista em determinada área. Sem esse registro, ele não pode se anunciar como especialista — ainda que tenha experiência ou atue na prática naquela área. O número do RQE deve estar sempre vinculado à especialidade divulgada, como prevê o artigo 1º da Resolução CFM nº 2.336/2023 (antiga Resolução CFM nº 1.974/2011).
Publicidade médica: o que diz a Resolução CFM nº 2.336/2023
A nova resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) sobre publicidade médica reforça os limites éticos da divulgação profissional, especialmente no que diz respeito à apresentação de especialidades. O artigo 11 é claro ao proibir que médicos sem RQE façam postagens ou se identifiquem como especialistas em qualquer canal público, inclusive redes sociais, páginas na internet ou materiais promocionais.
Mais do que isso: mesmo postagens que mencionem doenças, tratamentos ou órgãos relacionados a determinada especialidade — sem que o médico tenha o RQE correspondente — podem ser consideradas infrações éticas por induzirem o público à confusão.
Fiscalização intensa: como os processos começam?
Ao contrário do que muitos profissionais imaginam, a maior parte dos processos ético-disciplinares sobre publicidade médica não se origina de denúncias de pacientes, mas de monitoramentos feitos pelo próprio CRM. O CODAME (Comissão de Divulgação de Assuntos Médicos) realiza buscas ativas, especialmente nas redes sociais, identificando perfis que possam violar as normas éticas da profissão.
Foi justamente por esse motivo que a médica de Goiânia, especializada em clínica geral, foi presa. Ela se apresentava como nutróloga e endocrinologista, oferecia tratamentos para emagrecimento com substâncias restritas e sem respaldo científico adequado, e não possuía alvará sanitário. A repercussão do caso evidencia como o uso indevido da publicidade médica pode gerar não só sindicâncias e suspensões, mas também consequências penais e civis.
Quais os riscos para o médico?
- Processos ético-disciplinares no CRM, podendo levar à advertência, censura, suspensão ou cassação do registro profissional;
- Imputação por propaganda enganosa, nos termos do Código de Defesa do Consumidor;
- Imputação por exercício irregular da medicina, caso atue fora da sua competência comprovada;
- Responsabilidade civil por danos a pacientes, especialmente em caso de efeitos adversos decorrentes de condutas não respaldadas legalmente.
Como se proteger?
- Só divulgue especialidades para as quais você tenha RQE registrado no CRM.
- Evite publicações que associem sua imagem a doenças, órgãos ou procedimentos específicos de especialidades que você não detém.
- Tenha orientação jurídica especializada para revisar o conteúdo publicitário e atuar de forma segura.
- Busque o registro de especialista junto ao CRM assim que concluir a residência médica ou pós reconhecida pela AMB/CFM.
- Evite divulgar preços, antes e depois ou promessas de resultados, como também está vedado pela Resolução.
Conclusão
A publicidade médica não é proibida, mas precisa ser feita com responsabilidade, equilíbrio e, acima de tudo, dentro dos limites legais. Médicos que exercem especialidades sem o devido RQE correm sérios riscos de sanções, inclusive criminais, além de comprometerem a confiança dos pacientes e a integridade da profissão.
Por isso, se você é médico e atua em áreas de especialidade sem o devido RQE, evite qualquer forma de publicidade nesse sentido até regularizar sua situação. E mais: contar com um advogado especializado em Direito Médico pode fazer toda a diferença na proteção da sua imagem e no exercício seguro da sua profissão.