Muitas vezes, o usuário de plano de saúde, ao solicitar a liberação de determinado tratamento ou procedimento cirúrgico indicado pelo médico, depara-se com a negativa da operadora, sob o argumento de que este não se encontra listado no Rol da Agência Nacional de Saúde (ANS), reportando-se aos termos contratuais.

Afinal, é possível reverter tal negativa através do Poder Judiciário?

Recentemente, vem sendo amplamente divulgado o julgamento realizado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que entendeu ser taxativo, em regra, o rol de procedimentos e eventos estabelecido pela Agência Nacional de Saúde (ANS), não estando as operadoras de saúde obrigadas a cobrirem tratamentos não previstos na lista.

Entretanto, alguns parâmetros foram fixados, para que, em situações excepcionais, os planos custeiem procedimentos não previstos na lista, a exemplo de: terapias com recomendação médica, sem substituto terapêutico no rol, e que tenham comprovação de órgãos técnicos e aprovação de instituições que regulam o setor.

Vale frisar que tal entendimento não é de aplicação obrigatória a todos os casos semelhantes, tratando-se somente de entendimento jurisprudencial, que pode servir de orientação aos Tribunais na apreciação das demandas.

Nesse sentido, destaca-se que apesar do julgamento realizado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) permanece, em maioria, com o entendimento de que “Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura e custeio de tratamento sob o argumento de natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS”.

De acordo com os desembargadores, o entendimento do STJ não altera, a princípio, a análise das questões em sede de urgência, o que mantém a obrigação da operadora de custear os procedimentos, uma vez que foi prevista, em situações excepcionais, a possibilidade de discussão judicial acerca da cobertura de procedimentos não arrolados.

Conforme entendimento já pacificado no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), devem os beneficiários se socorrer do Poder Judiciário ao verem seus direitos tolhidos, especialmente por se tratar de negativa abusiva (sob o argumento de o procedimento não constar no Rol da ANS), que pode colocar a sua saúde e vida em risco.

A título exemplificativo, apresentamos alguns dos inúmeros casos de sucesso sobre este tema patrocinados pela banca do J&G Advogados:

“(…) Irrelevância do rol da ANS. Em que pese o teor da contestação da ré, entendo que não possa prevalecer a exclusão de cláusula contratual de procedimentos não previstos em rol da ANS.

O TJSP já pacificou esta discussão e emitiu a Súmula nº 102 com a seguinte redação: Súmula nº 102 – Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS.

O contrato vigente entre as partes é de trato sucessivo, cujos efeitos e cumprimentos prorrogam-se no tempo. Tal característica impõe, a meu ver, interpretação mais favorável ao consumidor, na forma do art. 47 do Código de Defesa do Consumidor (lei federal nº 8.078/90), deforma que eventuais procedimentos médico-hospitalares, mais recentes e não previstos no rol, devam ser paulatinamente incorporados ao contrato, com imperiosa cobertura pela empresa requerida.

Entendo que uma interpretação contrária à natural evolução da ciência, com a limitação das obrigações da ré a um rol taxativo ou tabela unilateral, implicaria na negação da própria finalidade do contrato que é assegurar a continuidade da vida e da saúde da parte autora.

Se o procedimento necessitado pelo autor é indispensável para a recuperação de sua saúde, impõe-se reconhecer que a ré deva custeá-lo a fim de que o contrato tenha sua finalidade garantida (…)

Portanto, sendo indevida a negativa da ré por ausência de previsão do tratamento no rol da ANS, é medida de rigor o acolhimento dos pedidos iniciais.” (1003326-49.2022.8.26.0011)

Plano de Saúde. Ação de Obrigação de Fazer. Pleito fundado em negativa de cobertura de cirurgia bariátrica. Sentença de procedência. Inconformismo da ré. Alegação de doença preexistente e não atendimento das diretrizes estabelecidas pela ANS para cobertura da gastroplastia. Descabimento. Comprovação da existência de doença preexistente que deve ser realizada com a apresentação de exame médico admissional à época da contratação – É dever da operadora, quando da contratação do plano de saúde, realizar exames para constatar doenças preexistentes, o que não foi feito – Súmula 105 do TJSP. Descabimento, ademais, da alegação de que o caso do autor não se enquadra nas diretrizes estabelecidas pela ANS para tornar a cobertura do procedimento obrigatório, pois, a relevante circunstância do tratamento em epígrafe ter sido indicado pelo médico que o assiste, único profissional com autoridade de eleger qual o tratamento a ser realizado, é suficiente para acolher a pretensão deduzida na inicial. Sentença mantida. Recurso desprovido. (TJ-SP – AC: 10029447420208260157 SP 1002944-74.2020.8.26.0157, Relator: Coelho Mendes, Data de Julgamento: 15/09/2021, 10ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 15/09/2021)

Diante de todo o informado, fica claro que o Rol da ANS lista apenas o mínimo de procedimentos que devem ter a cobertura garantida pelas operadoras de planos de saúde, sendo certo que o simples fato de um tratamento ali não constar não justifica as abusivas negativas rotineiramente apresentadas aos beneficiários que, por questão de saúde, necessitam dos tratamentos prescritos.